terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Ya está, ya está


Se de um jogo de futebol a minha vida se tratasse, o voz-off - da Antena 1 - estaria neste momento a larinjar um inevitável "já está!, já está!", mas sem aquela música de fundo, género martelada de segunda categoria do Montijo.

Descreveria o golo como lance individual de interessante recorte técnico, pautada por alguns rodriguinhos, porventura desnecessários, por avanços e recuos, mas sobretudo por sucessivos esgares de surpresa e reflexão na cara do jogador, causados pelo próprio desenrolar da jogada. Não deixaria de apontar a indecisão que lentamente conquistava os seus movimentos, para logo a seguir, em debate com o outro comentador, porque há sempre mais do que um, concluir pela necessária ligação desta com o leque de opções de qualidade de que dispunha para marcar golo, leque esse que cortava o vento e deixava apenas um silêncio, ensurdecedor para o jogador, que se misturava com as vontades do público e descrições dos comentadores, silêncio ansioso causador de voltas, rodriguinhos e esgares de tal ordem, que a dada altura era impossível para o jogador destrinçar o silêncio do barulho, perdido que estava em rodopios.

Pelo meio, registaria a inexperiência do puto, não obstante o futuro que uns quantos - não sabia ao certo precisar um número - lhe agoiravam, pretexto ideal para novo debate - este, inconclusivo - com o colega de voz rouca e sensata, agora sobre o eventual excesso de pressão colocado nos ombros, ou melhor, nos pés, ou seria na voz, do jogador, apanhado de surpresa nesse turbilhão de opções, e "talvez ainda verde para estes palcos", tirada final que as suas cabeças se encarregariam de arrumar na área dos consensos possíveis, lado a lado com inúmeros se calhares, e uns quantos - carcomidos por informalismos linguísticos - porventuras e quiçás.

Após tanto serpenteio em preliminares, relataria o golo em si, fazendo ver aos ouvintes que a unanimidade quanto ao modo de finalização escolhido pelo jogador era de obtenção improvável, se não mesmo impossível. Lembrar-se-ia da discussão labiríntica que mantinha desde pequeno com o seu Tio Carlos, sobre Prost e Senna, mas acharia por bem não a referir, uma vez que desconhecia a opinião do seu colega de voz rouca e sensata, inclinando-se contudo a identificá-lo com o aborrecido Prost. Não queria novo debate, se bem que à noite, já de microfones desligados, daria o melhor de si para fazer ver ao seu colega que o Senna é que era.

Por fim, e após incessantes sinais vindos do técnico de estúdio para dar por encerrada a transmissão, faria ver que o puto, mais do que contente por ter marcado o golo, que o estava, e disso o comentador não tinha dúvidas, exibia nos seus olhos as cores da serenidade, determinação e confiança, esperando com essa perspicaz observação lançar o debate, nas casas que o acompanhavam, sobre o significado desse olhar, apesar de, em conferência com os seus botões, ter chegado à conclusão que tal semblante era um sinal inequívoco de que o jogador tinha finalmente percebido que, face às alternativas que tinha para marcar golo, seria sempre um golaço, mas mais importante do que isso, era seguir o seu instinto na hora do remate, porque ninguém nos conhece melhor que o nosso instinto.

4 comentários:

eskilsson disse...

Fantástica visão da coisa pá. Muitos parabéns. Estamos todos a ficar empregados... e velhos!

Um abraço

Antonio Gomes disse...

parabens ze! Impacavel!

rosé mari disse...

gracias:)

Anónimo disse...

mt trabalho. prepara-te!
vais ganhar bem, mas trabalhar q nem um cão!
xikelio