quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Amor

Amar, mais não é* do que ter vontade - vontade positiva, e não vontade medrosa - que o nosso destino a todo o prazo - curto, médio, longo ou ad finem - seja definido, não só por nós, mas também, talvez sobretudo, por quem amamos. Seja homem, mulher, ou outra coisa qualquer. É como se entregássemos a essa pessoa, embrulhado (a forma do embrulho variará consoante a pessoa que entrega) num daqueles papéis de seda típicos das lojas de roupa fancy, parte da nossa autodeterminação. No fundo, amar acaba por ser uma declaração tácita, passada por quem ama em nome de quem é amado e que diz, essencialmente, "Faz de mim o que quiseres (e se possível trata-me bem)". E isso não acontece com o desejo, vulga paixão. O desejo termina quando a vontade que temos de outra pessoa é saciada, algo que pode demorar mais ou menos tempo. Normalmente, quanto mais tempo dura, mais se dá a tendência para confundir o simples desejo com amor; mas são coisas diferentes, ainda que aquele se inclua neste: o amor também é desejo, também é vontade da outra pessoa. O movimento, contudo, é inverso. Não queremos que quem amamos venha até nós, mas sim o contrário: queremos ir até essa pessoa, sair de nós mesmos na sua direcção. O movimento é centrífugo, e não centrípeto. Amor será, então, desejo corajoso (d)e entrega do nosso presente e futuro. E o simples passeio de um cão é suficiente para nos apercebermos disso, porque o amor não existe, não se manifesta, apenas nos actos grandiosos.

*claro que é mais, muito mais. Mas já que é para arriscar definir numa frase algo que todos ambicionam sentir mas quase ninguém ousa definir, que seja com alguma - indispensável - dose de bazófia.

5 comentários:

mc disse...

Deixo-te a melhor definição, apesar de simples e por ser simples, que me lembro de ter encontrado para amor:

"O amor não se manifesta através do desejo de fazer amor (desejo que se aplica a um número incontável de mulheres), mas através do desejo de partilhar o sono (desejo que só se sente por uma única mulher)."

Teresa disse...

Milan Kundera?

Carol disse...

Milan Kundera

rosé mari disse...

pus essa frase aqui há uns tempos, se não estou em erro. é brutal! mas identifico-me particularmente com esta.

mc disse...

Sim, Kundera!
De onde esta veio há muitas mais